SAÚDE
“Eu sou normal”
Texto Assessoria de Imprensa
Foto(s) Texto e fotos Gabriel Portella
Foto(s) Texto e fotos Gabriel Portella
Publicado em 16/08/2021
Aos 12 anos, Gabriel, portador de síndrome rara, já passou por mais de 20 cirurgias. Nascido de 32 semanas, ele ficou no hospital seis meses após o seu nascimento
O sol nasce tímido, assim como o movimento na cidade de Céu Azul. Na rua, os primeiros carros começam a circular e as primeiras pessoas, em sua maioria trabalhadores, começam a pulsar a vida daquele pequeno município no oeste do Paraná. Em uma casa ali no centro da cidade, Gabriel, um simpático menino de doze anos de idade, acorda prontamente para mais uma segunda-feira ao som de um animado louvor escolhido por seu pai, Gledson Elias.
Ligeiro e alegre, Gabriel sai do seu quarto, começa a se arrumar para assistir a aula e logo esbarra com sua irmã gêmea, Marina Elias, e seu irmão caçula, Emanuel Elias, o qual exteriorizava um banguela e gracioso sorriso. Monitorando os filhos, o pai Gledson auxiliava-os com suas tarefas, enquanto a mãe, Andreia, preparava carinhosamente o café da manhã da família, que era composto por cremosos chocolates quentes, pães com manteiga, chá, bolacha ao leite e outros alimentos.
Uma família tradicionalmente comum, mas com um detalhe único: Gabriel é portador da Síndrome de Treacher Collins, um distúrbio de desenvolvimento craniofacial que, conforme o Centro de Pesquisa sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL), é causado, em cerca de 90% dos casos, por mutações no gene TCOF1. A Síndrome de Treacher Collins é caracterizada por hipoplasia malar (achatamento dos ossos malares da face), micrognatia (queixo pequeno), orelhas pequenas, mal-formada ou ausentes, surdez parcial ou total, fendas palpebrais inclinadas para baixo, coloboma e palato estreito ou fissurado. Os impactos da síndrome, que é rara e afeta anualmente uma a cada 50 mil crianças que nascem, não são só estéticos, podendo comprometer a fala, respiração, audição e a alimentação.
Aos 12 anos de idade, Gabriel já passou por mais de 20 cirurgias, sendo a primeira delas em poucas semanas de vida. Nascido de 32 semanas, ele ficou no hospital seis meses após o seu nascimento, onde passou por inúmeros exames e procedimentos que foram essenciais para o seu desenvolvimento. “Engravidei através da fertilização in vitro e foi tranquilo, só que quando a Marina e o Gabriel nasceram nós vimos que ele tinha o palato fissurado”, explica a mãe Andréia. “Os médicos não estavam conseguindo dar um diagnóstico exato e então fomos transferidos para o hospital universitário da Universidade de São Paulo (USP), onde fomos informados do diagnóstico”.
Ela relembra com tranquilidade todo o esforço que a equipe médica fez para cuidar do Gabriel, trabalho decisivo para o seu crescimento. “Como eles são referência no tratamento de síndromes como esta, eles sabem muito bem como lidar com as situações. Eles têm uma sala cheia de brinquedos para as crianças ficarem no período pré-operatório, então é tudo muito tranquilo.”
HORA DO SUCO
Ao sentar na mesa, Gabriel ataca o seu café da manhã, mas nem sempre é assim. “Para nós, é normal comer e respirar, o Gabriel teve que aprender”, diz Andreia, ao relembrar os anos em que o filho só se alimentava por sonda. “No início, ele tinha dificuldades, mas percebi que ele se esforçou para aprender quando o Emanuel nasceu, pois ele queria comer junto com o irmão.”
Ela ressalta que a cobrança por uma alimentação saudável é diária. “Cobramos que coma carne, verduras, frutas, de tudo um pouco”. Há ainda a necessidade de tomar um “suco” especial diariamente, o qual contém nutrientes que suplementam a alimentação. Para isso, a família criou a “hora do suco”, um momento logo após o almoço onde todos os filhos recebem um copo de suco para tomar enquanto fazem suas tarefas escolares ou arrumam seus quartos.
EXTRAORDINÁRIO
“Eu não lembro muito de quando era mais novo, nem das cirurgias”, diz Gabriel sentado na beira da cama, enquanto bebe seu suco. “Eu lembro mais dos amigos que fiz em São Paulo e da minha doutora”. Durante a conversa, ele se apressa em procurar em sua mini biblioteca o livro “Extraordinário”, escrito pela R. J. Palacio, que conta a história Auggie Pullman, um menino norte-americano com a mesma síndrome. “Eu conheci lá em São Paulo o autor do prefácio do livro”, diz, enquanto procura a carinhosa dedicatória que Francis Smith, autor do prefácio da nova edição do livro, fez. “Foi bem legal, eu conversei em inglês com ele!”.
VIDA NORMAL
Gabriel, que não conseguia comer e respirar ao mesmo tempo até os sete anos de idade, fala que no começo era difícil, mas que se acostumou. Hoje, se sente entusiasmado em participar das atividades em sua rotina, a qual, conforme a mãe, é bem agitada. Devido a pandemia, a rotina ficou extremamente restritiva.
Antes, quando o garoto ia à escola, a sua professora necessitava usar um pequeno microfone, acoplado a sua vestimenta, que era conectado aos aparelhos auditivos. Dessa maneira, ele conseguia ouvir ela melhor. No entanto, agora ele assiste às aulas apenas de maneira remota. Questionado sobre sua Síndrome, Gabriel não tem muito o que dizer, apenas uma sincera e realista frase: “Eu sou normal, não sou diferente de ninguém por causa da síndrome”.